2022 trouxe um sentimento conflitante: se por um lado tivemos um crescimento de 5 pontos na economia do país, por outro tivemos que rebolar para absorver o aumento nos alimentos, que bateu e 12.
O setor de Alimentação Fora do Lar, assim como tudo na atual economia globalizada, é cíclico, apresentando altos e baixos ao longo do tempo. Nada mais natural! Mas falar de macroeconomia é uma maneira simplista de despersonalizar especialmente os pequenos negócios, quase a totalidade na nossa área, e explicar, genericamente, porque não é comum ter bares e restaurantes longevos no Brasil.
Fazendo uma breve retrospectiva, vimos que a partir de 2004 vivemos nosso melhor momento, com pico em 2010, onde a maioria das empresas navegou em céu de brigadeiro, contratando e gerando lucros que deixavam os empresários numa situação singular de conforto. Fruto do momento em que o Brasil passava e durou até 2014 com o início da crise das commodities e a queda dos investimentos externos.
Nosso Produto Interno Bruto seguiu uma curva ascendente e com exceção de 2009, durante a crise internacional, tivemos taxas espetaculares. Como resultado, seguiu-se um período onde se tinha crescimento elevado do PIB e pleno emprego, quando a taxa de desocupação teve sua menor marca atingindo meros 4,8%.
Aí o buraco se abriu e o negócio ficou nebuloso. Em nossas reuniões e debates, se especulava longamente quando retornaríamos ao patamar anterior. Assim passamos 2015 e 2016.
Inúmeras empresas Brasil afora operaram com lucros mínimos, típicos da indústria de base, onde o volume de negócios suporta margens baixíssimas. Foi um período duro, pesado, de testes de sobrevivência à exaustão.
Momento de olhar pra dentro. Automatizar, cortar despesas, demitir. A reavaliação de processos estava na ordem do dia. Reengenharia virou tema corrente. Foi uma reinvenção do setor. Em 2017 se estimava que mesmo com a pequena reação do PIB, voltaríamos aos anos de ouro dos negócios brevemente. A aposta foi que 2019 seria comemorado. Até lá era apertar os cintos e depois, quem sobrevivesse, voltaria a dar risada.
Chegou 2019 e nada. Adiamos o sonho… Mas aí, também do nada, chegou a pandemia. Uma situação que nenhum de nós jamais havia visto. A última que poderia ser comparada foi a Gripe Espanhola, no início do século passado. Uma hecatombe sobre nossos negócios. A exceção do setor de Eventos, fomos os que mais sentiram seus efeitos. Encerramos o ano com 82% operando no vermelho!
Somente no segundo semestre do ano seguinte houve alento. Fechamos 2021 com 3% de crescimento real. Com nossa capacidade de recuperação rápida, reforçada pelos auxílios públicos que injetaram dinheiro na base da pirâmide, ressuscitamos. O impacto foi tamanho que as grandes redes mostraram em seus balancetes que os resultados nacionais foram salvos pelas operações no Nordeste, onde o dinheiro governamental impacta mais.
No último ano tivemos boas notícias, mais uma vez vindas do governo, que ampliou o Auxílio Brasil e o País cresceu, gerando três milhões de empregos. Mas fechamos 22 ainda com 18% das empresas operando com prejuízo e 37 em equilíbrio. Isso quer dizer que mais da metade continua sem fazer dinheiro e incapazes de enfrentar as dívidas acumuladas.
O ano que se encerrou agora teve aspectos curiosos. Se por um lado tivemos um crescimento de 5 pontos na economia do País e conseguimos reajustar nossos preços levemente acima da média inflacionária - que girou em torno de seis e majoramos nossos produtos pouco acima de sete – por outro tivemos que rebolar para absorver o aumento nos alimentos, que bateu e 12. Quer dizer, nosso principal insumo subiu muito mais. Sufoco para os negócios, que cresceram mas viram suas margens virar pó.
Os que se mantém vivos, tem no horizonte margens baixas e falta de capital para quitar as dívidas contraídas na pandemia. Contas que sobraram na busca pela alternativa do momento passado, quando tentando sobreviver, recorreremos a bancos e a toda linha de crédito que se conseguisse acesso. Mas a hora de pagar chegou. O Perse está aí, mas atende uma minoria. O Pronampe subiu loucamente e está tirando o juízo de muito empreendedor.
Um estudo do FMI feito em 130 países mostra que destes, uma centena injetou dinheiro a fundo perdido no setor. Por aqui não tivemos isso. Poderia ser pior, claro. Como a inflação é mundial, praticamente todos os países estão sofrendo. Aqui pelo menos não corroeu salários, como nos Estados Unidos. É um bom atenuante.
Então, o que fazer?
Naturalmente otimistas, os donos de bares e restaurantes, por sua própria natureza, estão apostando na retomada dos negócios, mas a gestão precisa ser acompanhada com muito atenção. Já vi consultor proclamar que gostaria de ficar só com um percentual mínimo do que se perde no setor abrindo empresas de afogadilho e sem gestão profissional.
É patente que o brasileiro não é bom de contas. Não é diferente conosco. Claro que há empresas geridas com extrema racionalidade e acompanhamento preciso de seus indicadores. Mas são exceção. O grosso do setor é formado por empresários-trabalhadores. Gente que bate o escanteio e corre pra cabecear. Não se tem hora pra iniciar o trabalho e muito menos para encerrá-lo diariamente.
A maioria de nós faz gestão financeira, administrativa, de pessoal, e, muitas vezes, está na cozinha ou no salão, fazendo o papel de um ou mais trabalhadores. Muitos sabem que precisariam de horas a mais para planejar, executar e, principalmente, acompanhar os números da empresa, mas como arranjar tempo para isso?
Há quem não saiba quanto gasta com energia elétrica, que não faz um cálculo de ficha técnica ou CMV, que não tem noção de quanto a folha de pessoal representa, o percentual comprometido com aluguel ou taxas de cartões e vouchers.
E é aí que está o desafio deste 2023. É preciso radicalizar! Controlar custos, reduzir desperdícios, treinar equipes e garantir não só a satisfação, mas surpreender o cliente. As últimas notícias apontam pra redução da projeção de crescimento do PiB mundial. Dinheiro não será fácil. Parafraseando um camarada que se autointitula médico de empresas, o consultor Marcelo Bavelloni, o óbvio virou diferencial competitivo.
Porque ninguém faz!
*Max Fonseca é jornalista, empresário no setor de bares e restaurante e conselheiro nacional da Abrasel